terça-feira, 8 de outubro de 2013

Aviso: você está sendo filmado!

Foto: Fabrício Amorim
O médico recomendou à dona Elizabeth caminhar frequentemente para melhorar a saúde. Que boa oportunidade para sair com Francisco e Josephine, retirando a responsabilidade de Maria, que além das obrigações na casa tinha que passear com ‘Chico’ e ‘Phine’. Mas não os chame pelo apelido. Dona Elizabeth acredita que invocá-los desta maneira pode alterar o comportamento do lhasa apso e da yorkshire. 

Depois de um mês de atividade diárias, Elizabeth já se sentia diferente. Sair bem cedo para caminhar na praça bem próxima de sua casa em um bairro nobre da capital paulista junto com seus amigos tornou-se uma rotina divertida. Entretanto, ficou chocada numa bela manhã de sol ao perceber que a sola de seu sapato estava suja por causa de fezes humanas. Para o excremento de seus cães não ligava muito, se fazia de despercebida, quase não via o cachorro agachado. É um animal, ora. Agora, a mesma atitude vinda de um ser humano era diferente, totalmente desrespeitoso, verdadeiro insulto, e aquilo a incomodava demais. Com isso, iniciou diálogos calorosos com os vizinhos, carregados de revolta. A balbúrdia logo juntou meia dúzia de pessoas e a solução não tardou: resolveram colocaram placas de avisos próximas aos pontos asquerosos: “não faça cocô, respeite as crianças. Obs. Você está sendo filmado”. 

A câmera era um blefe. O aviso, contundente.

Na saída da praça, dona Elizabeth cumprimentou o segurança que, junto a outros colegas, faz o monitoramento 24 horas da rua – que tem menos de 1 quilômetro de extensão. Trajados de roupa social, terno e gravata, capacete e moto, os profissionais comunicam-se diretamente com a base em caso de alguma atitude suspeita ou crime. O pior turno é o noturno. Apesar de nenhuma ocorrência nas proximidades, os moradores sempre intensificam os apelos por cautela. 

Naquela noite, o trabalho era de Edmílson, que não gosta nem um pouco da tarefa naquele horário. O segurança tem dificuldade para dormir durante o dia, no barulhento prédio popular em que vive no bairro do Jardim São Luís. Fora que, jantar antes do trabalho era um dilema: seu recente problema no intestino estava pregando verdadeiras peças de terror na noite fria. Não há um único banheiro em um raio de quilômetros. Quando isso ocorre, sempre pensa em milhares de alternativas, mas não pode ausentar-se por muito tempo: tem que ficar olhando a movimentação da rua silenciosa. Então, a saída encontrada é encostar a moto e escolher o canto mais escuro da praça para se aliviar. 

O mais indicado, no entanto, seria tocar a campainha da Dona Elizabeth, que geralmente dorme em sono profundo, protegido por muros enormes, grades eletrificadas, e, por Edmílson. Mas é claro que incomodar a madame com um pedido 'inconveniente' nem passa pela cabeça do segurança. Assim a vida continua, arraigada pelos ditames paradoxos de quem pode mais. 

domingo, 6 de outubro de 2013

Rede e o Shangri-La partidário

Marina Silva e Eduardo Campos
Foto: Reprodução
Com os pés fincados nos pilares da sustentabilidade e na defesa dos grupos ambientalistas na criação de sua Rede, a ex-senadora Marina Silva retornou à realidade partidária onde as legendas não diferem no fisiologismo político.

A decepção de parte da militância da Rede, que aguardava a criação de uma agremiação que fizesse uma “nova política”, longe de relações promíscuas e nomes jurássicos, ganhou força com a filiação “simbólica” de Marina no PSB.  

Em 2011, na votação do Código Florestal, 27 dos 30 deputados do PSB votaram a favor da bancada ruralista. No ano passado, o bloco ficou dividido: 16 votos para a tese ambientalista e 9 contra. Com a concretização de uma chapa puro sangue com Eduardo Campos – onde Marina deve ser a cabeça – não será difícil ver a ex-senadora dividindo palanques nas cidades com Heráclito Fortes e Paulo Bornhousen. Na curva à direita na busca de apoio, o PSB já conversa com DEM e PPS, o que pode enfraquecer possível campanha de Aécio Neves – que vê no retrovisor o incômodo José Serra – empolgado pela movimentação de Marina que pode ressoar seu nome no ninho tucano.

Chavismo

Marina está certa ao criticar o casuísmo na tentativa de aprovação no Congresso de projeto que sufocava as novas legendas, diretamente apoiado pelo Planalto. No entanto, falha ao comparar a continuidade do governo petista ao chavismo. “Chávez mudou a lei eleitoral para garantir maioria no Parlamento – mesmo perdendo votos; pressionou a imprensa e a mídia, partidarizou o governo. Nada disso pode ser assacado contra os governos Lula e Dilma, a não ser por aqueles que têm pouca preocupação com a realidade. A própria nomeação de petistas para cargos de confiança não deve ter sido maior que a de tucanos e pefelistas no governo FHC, e, além disso, está muito longe do que fez Chávez”, diz o professor de Filosofia Política da Universidade de São Paulo (USP), Renato Janine Ribeiro.

Teorias de alguns pensadores gastam muitas linhas para mostrar a “progressão do Chavismo no Brasil”, implementada silenciosamente pelo PT. Coisa da América Latina. Na Alemanha a reeleição de Ângela Merkel não é encarada de maneira pejorativa. Faz parte da democracia, ora. A compra de votos para a reeleição de FHC em 1998 parece uma gastrite incurável para quem está na oposição. Oh, dor de estômago maldita! 

sábado, 5 de outubro de 2013

Um Eduardo incomoda muita gente. E com a Marina incomoda muito mais.

Marina Silva e Eduardo Campos
Foto: Eduardo Braga/FolhaPress
Sem êxito na criação da Rede Sustentabilidade, a ex-senadora Marina Silva decidiu ingressar no PSB, consolidando-se como terceira via para o pleito de 2014. É, sem sombra de dúvida, uma grande vitória para o presidente da sigla Eduardo Campos, que acabou com uma aliança histórica com o PT, aproximando-se e atraindo nomes da oposição em um processo de realinhamento do partido.  

A novidade não configura, no entanto, um bom cenário para Aécio Neves (PSDB) que pode ficar de fora do segundo turno, este sim, assegurado. O capital de 20 milhões de votos adquiridos em 2010 por Marina deve levar a disputa para uma segunda etapa desde que a ex-senadora seja a cabeça na chapa puro sangue. É um cenário arriscado para Campos, porém Marina deve projetar a sigla enquanto cria sua Rede. Difícil crer nessa hipótese dadas as claras e legítimas ambições de Campos. Grande parte da população não vota em partidos, mas sim em nomes. Nisso, é certo que os dois quadros devem bater de frente na eleição de 2018 e, por isso, não encaixam na mesma engrenagem por muito tempo. 

O grupo governista, por sua vez, deve estar coçando a cabeça e fritando os miolos. Marina representa grande peso nas urnas e Campos têm muita representatividade em sua base, o que pode levar o PT a perder votos importantes e fundamentais no Nordeste. O cenário em condições de igualdade dependerá muito do desempenho da economia e dos reflexos do julgamento do mensalão, o que se mostrou inócuo na vitória de Fernando Haddad (PT) em São Paulo. João Santana deve estar repensando a "antropofagia de anões", expressão que utilizou para comentar a eleição de 2014 em que crava vitória de Dilma no primeiro turno. A entrevista com o marqueteiro está disponível na Revista Época desta semana.

Com o discurso de “novas idéias e práticas políticas” Campos e Marina tem como alvo acabar com a polarização PT x PSDB. É possível. A argumentação marinista, entretanto, não cola. A Rede nascia dizendo: “somos diferentes”, com a promessa de não compactuar com a ‘mesmice’ política, de não entrar no ‘establishment’.  A realpolitk, porém, tem gosto amargo e Marina deve saber bem disso agora. Segundo Marina, sua decisão levou em conta quebrar a polarização existente no país. Com isso, conversas com o PPS de Roberto Freire já ganham corpo. A opção de Marina no fechamento das portas da filiação partidária (hoje) demonstra a confiança do projeto de uma ‘nova oposição’ em confronto direto com o esgotamento do lulismo – que ainda tem muito fôlego nas urnas. Vai ser interessante. 

Rede

Ficou difícil pensar, argumentar, analisar, conversar sobre a decisão do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) que barrou a Rede. Em qualquer indicação a favor do TSE, não demorava pra ser taxado de governista, reduzindo a discussão ao ponto zero. A estranheza partiu da aprovação do PROS e do ‘Solidariedade’, partidos que incharam ainda mais o quadro político: são 32 legendas ativas e mais 25 esperando o aval do Tribunal. O provável casuísmo que ajudaria a tirar Marina Silva do páreo perde força, no entanto, ao analisar o tempo que as novas siglas vêm tentando o registro. O PROS, Partido Republicano da Ordem Social é construído desde 2006. O ‘Solidariedade’, de Paulinho da Força, desde 2008. 

A Rede começou a busca de assinaturas e outras exigências a partir do final do ano de 2010. O naufrágio no TSE (6x1) da Rede  não prova que os cartórios eleitorais funcionam bem, nada disso. O sistema sem dúvida tem falhas, morosidade, e o erro de Marina e seu grupo – que agora rachou – foi não ter buscado gordura extra para queimar. Agora, com o ingresso no PSB, resta acompanhar se os sonháticos vão retornar do mundo dos sonhos e aderir a realpolitik. Com os dois pés no chão a política pode ser bem diferente.   

sexta-feira, 4 de outubro de 2013

Campos aposta no esgotamento do lulismo

Governador de Pernambuco
Eduardo Campos (PSB)
O PSB desgarrou-se da base do governo Dilma Rouseff (PT), acabou com uma aliança histórica em diversos Estados em todo país, o que demonstra claramente a ambição do governador de Pernambuco Eduardo Campos em pavimentar caminho para se candidatar à Presidência da República, apostando no esgotamento do ‘lulismo’. 

O afastamento da sigla do PT denota tendência de aproximação com a oposição, que por sua vez, enxerga com bons olhos a mudança de direção de um dos principais aliados do governo. O PT deixou as portas abertas pensando principalmente em eventual segundo turno em 2014. A meta do pessebista é eleger 50 deputados federais (tinha 35 e perdeu 6) para incrementar tempo de TV e fundo partidário para 2018. Para isso, Campos acredita que o descolamento é fundamental para o projeto ganhar corpo e um retorno é muito improvável, como afirmou recentemente a Lula, seu padrinho político que tentou evitar a debandada.  

Antes que o governo agisse, as pastas do Desenvolvimento e dos Portos foram entregues pelos ministros Fernando Pimentel (PSB) e Leônidas Cristino (PSB) e a partir daí as rupturas começaram a aparecer aproveitando o prazo limite para troca partidária, amanhã (5). Cid Gomes, governador do Ceará, e Ciro Gomes, atualmente na secretaria da saúde no governo de seu irmão, deixaram a agremiação e se filiaram ao neófito PROS (Partido Republicano da Ordem Social) que tende a apoiar o governo.

Agora, inimigos históricos do petismo que não escondem seu viés conservador foram atraídos pela sigla liberal. Heráclito Fortes e Jorge Bornhausen assinaram esta semana sua filiação no PSB. Na busca de palanques regionais Campos costura acordos com PSDB, DEM e PPS em 20 Estados. Puxadores de voto do esporte como Romário, Fernando Scherer, Leonardo Moura e Edmundo também aderiram à sigla.

Eduardo Campos, notavelmente um quadro importante na política nacional, percebeu o esgotamento do modelo ‘lulista’, e aderiu ao establishment político visando ser uma opção real de oposição ao governo. Agora, o grande desafio do pessebista será desbancar o PT em sua base. Caso consiga retirar votos de Dilma no Nordeste em 2014, Campos deixará claro que seu papel de coadjuvante rodeando a polarização PT x PSDB será de fundamental importância para o pleito.   

terça-feira, 1 de outubro de 2013

José Serra vai aceitar papel coadjuvante?


Foto: Alan Marques/FolhaPress
O projeto escalonado do ex-governador José Serra desceu diversas escadas após as sucessivas derrotas para o PT. O tucano não fez frente a Lula em 2002, caiu diante de Dilma Rouseff em 2010, e não foi páreo para o novato Fernando Haddad em 2012.

Empolgado com a queda vertiginosa da presidente Dilma Rouseff (PT) após as manifestações de junho deste ano, Serra reapareceu no cenário político e seu destino movimenta de maneira interessante o tabuleiro. De cara, a possibilidade de migração para o PPS chamou a atenção de Serra, mas a fusão com o PMN, que engordaria a sigla, naufragou.

Mesmo com os carimbos no currículo político, o tucano nunca escondeu a ambição de concorrer novamente à presidência da República, o que acarretaria numa disputa interna com o senador e mandatário do partido, Aécio Neves. Com nenhuma outra possibilidade no horizonte Serra adotou silêncio sobre seu futuro que foi encerrado hoje (1), a quatro dias do prazo final para filiações em outras siglas, regra determinada pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE), um ano antes das eleições.

E, como era aguardado, o tucano não abandonará o ninho. Bater vôo para o PPS, partido com poucas alianças nos Estados, pouco tempo na propaganda de TV e recursos escassos seria uma aventura arriscada e Serra não quer mais descer escadas.

A decisão coloca no ar a possibilidade de prévias, mas Serra sabe que suas chances são praticamente nulas diante de um adversário como Aécio, presidente da sigla que tem o partido nas mãos. Sobra então vagas para a disputa de cadeira no Senado ou na Câmara, tendo a primeira opção grande risco de nova derrota. Outra via seria apoiar Aécio e garantir algum Ministério no governo do mineiro.

Entretanto, quem conhece as bicadas ferrenhas entre os tucanos e o projeto do ex-governador de São Paulo sabe que a permanência de Serra significa confusão. Nomes importantes do grupo serrista já manifestaram em tom de ironia que iriam "apoiar Aécio assim como ele apoiou Serra em 2010". O auxílio de Geraldo Alckmin é dado como certo, porém o governador de São Paulo tentará à reeleição fazendo papel comedido. Com isso, o enfraquecimento das bases paulistas devem prejudicar Aécio  e as bicadas internas devem ser o prenúncio de um ano eleitoral agitado.

A escalada de José Serra rumo à presidência da República no seu projeto cego, sem limites, não permite papel coadjuvante no caminho, e portanto, vai na contramão do partido, batendo de frente com a caravana mineira. É só aguardar. 
ã Câmara, tendo a primeira opçãoum adversleiro.