sábado, 25 de maio de 2013

Favela do lado de 'cartão postal' não pode. Mas no Jardim Edite, Brooklin, o lado mais fraco venceu

Jardim Edite. Brooklin.
Ao lado, a ponte Estaiada.
foto: Fabrício Amorim
Bem estar pelo respeito à cidadania. Por uma redução da desigualdade gritante que durante séculos assolou, e ainda assola, milhões de pessoas. A miséria não é admissível em uma sociedade que os benefícios sociais são direito de todos, seja qual for a classe social ou posição hierárquica.

Nos últimos textos este blog tocou em temas sensíveis, espinhosos, mas que procuraram ser mais um norte, um singelo reforço na busca de uma reflexão sobre o Bem Estar, a Cidadania (conjunto de direitos), e as minorias. Um monte de besteiras para os defensores do neoliberalismo feroz. Um monte de palavras que ajudaram a enriquecer o debate para muitos outros.

Ao escrever sobre estes assuntos solto um grito da garganta que ficou preso - que preciso colocar para fora de qualquer maneira. Em uma entrevista ao jornal Folha de São Paulo (21/05), o cineasta Constantin Costa-Gravas, prestes a lançar seu filme “O Capital”, no Brasil (31 de maio), foi questionado sobre suas ‘inquietações políticas’, e respondeu: "Minha mãe sempre me dizia: 'Nunca se meta com política!'. Jamais pertenci a um partido ou defendi uma ideologia, mas é preciso se posicionar, deixar claro se você está do lado do mais forte ou do mais fraco. A indiferença é confortável, mas paga-se um preço muito alto por ela".

O cineasta foi preciso. Não é possível ficar em cima do muro ou muito menos se esconder. Mesmo adotando a submissão, algum lado é preenchido. No meu caso, o grito definitivo em favor de uma posição foi dado em 2007 com o início da ameaça de remoção da favela do Jardim Edite, localizado na cidade de São Paulo durante o governo Kassab. Neste triste episódio de tentativa de segregação (que ocorreu e muito nesta última administração), o final será feliz. Pelo menos se encaminha para isso.

E não foi fácil. Foram anos de batalhas judiciais na luta contra a prefeitura, em um embate que até o Ministério Público do Estado de São Paulo intercedeu. A favor das famílias, claro. Até o início de junho,  180 famílias (eram quase 800) retornarão ao local em que residiam na favela, agora urbanizada. Os prédios terão no seu entorno uma creche, uma escola técnica e uma Unidade Básica de Saúde (UBS), além da ponte Octavio Frias de Oliveira, popularmente conhecida como ponte ‘estaiada’, da Rede Globo, e de diversos monstros envidraçados que quase tocam o céu. “Os favelados invadiram e ganharam o apartamento. Eu também quero”, alguém irá vociferar. Sem contar os comentários preconceituosos, que é melhor não escutar e preferível não ler. Bom para a saúde do estômago, acredite. É importante enfatizar que os moradores quitarão suas casas em até 25 anos, de acordo com a condição financeira de cada um. Esta conquista é a concretização de um sonho e um suspiro de esperança contra a exclusão.    

Com as habitações devidamente ocupadas voltarei a falar sobre o assunto no blog. E este será o novo direcionamento. Continuarei abordando temas políticos, sejam eles quais forem, principalmente com este cenário antecipado e pujante. Desta vez, haverá atenção especial a temas que envolvam direitos humanos, direitos políticos, e a interferência do Estado na economia. Enfim, assuntos levantados por um chato e hipócrita. Em outras sociedades, debater, discordar, protestar é essencial para o crescimento de um país. Por aqui, muitas vezes, o cara é um “desagradável” que deveria sofrer uma ‘lavagem mental’ para não escrever tanta besteira. O pensamento crítico incomoda e nem ao menos é contestado de forma coerente, porque o texto não é lido. É a correria do cotidiano, vai, justifique. Neste caminho cheio de curvas, sigo na contra mão do pensamento individualista e meu combustível é o que deixa meu coração palpitante, meus olhos saltados e minha mente em erupção.    

quinta-feira, 23 de maio de 2013

O Brasil pode "mais", pode ser "melhor", e a criatividade dos bordões também

Dilma, Marina, Aécio e Eduardo 
A campanha antecipada para a presidência da República em 2014 já mostra as caras nas inserções comerciais em rádio/televisão  e  na imprensa. Os possíveis postulantes ao pleito Dilma Roussef (PT), Aécio Neves (PSDB), Eduardo Campos (PSB) e Marina Silva (Rede – ainda não criada oficialmente) aproveitam para mostrar suas idéias para o Brasil em qualquer oportunidade - mas, como se fosse uma corrida de automóveis em circuito oval. Todos na marcha lenta. O espaço deveria ser reservado à propaganda político partidária e não à propaganda de candidato eletivo. A veiculação de propaganda eleitoral só será permitida após o dia 5 de julho do ano que vem. Neste período,  o PT foi o único partido acusado pela Procuradoria Geral Eleitoral de fazer campanha antes do tempo estabelecido. Caso seja acatado pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE), o partido pode ser punido com cassação do direito de transmissão de propaganda eleitoral em bloco, além de multa. Assim, o TSE  faz vista grossa para a antecipação das outras agremiações, e a vida continua. Em círculos.  No entanto, na disputa prematura, os bordões semelhantes chamam a atenção.

A presidente Dilma Rouseff, que busca a reeleição, diz que “é possível fazer bem mais”. O favorito e provável nome do PSDB, Aécio Neves, preconiza que “é possível fazer melhor”. No ‘box’ do PSB, Eduardo Campos deu fortes indícios que iria se desgarrar do governo, e deve fazê-lo gradualmente. Atualmente, pisou no freio. Porém, anteriormente, o governador de Pernambuco enfatizou que “é possível fazer mais”. Marina Silva, por sua vez, corre atrás do registro do seu partido, a 'Rede', até outubro. Este é o prazo final para a sigla, ou qualquer outra, conseguir se oficializar perante o TSE - visando às eleições em 2014. Uma verdadeira maratona para a ex-verde, que juntou o bordão de Aécio e Dilma em um só. “É possível fazer mais e melhor”. Isso sem esquecer de José Serra, que em 2010, proclamava: “O Brasil pode mais”. Visionário. Perfeito. 

O otimismo tem que ser mesmo o carro chefe da ‘campanha’, elemento básico para o governante ganhar a confiança do eleitor. Da mesma maneira, o eleitor quer bons planos de governo - que mostrem uma boa direção para o país nos próximos anos. E para apresentar as idéias, nada melhor que discussões saudáveis, que sejam prósperas para o país. Tudo muito difícil quando não se tem nem originalidade para colar um bordão à sua imagem. Mas ainda dá tempo de mudar o slogan para o ano que vem, quando as campanhas forem oficializadas. Ou até antes. Por enquanto, a 'tempestade cerebral' dos marqueteiros parece ter sido uma 'garoa'. Sim, o Brasil pode “mais”, pode ser “melhor”, mas a criatividade também pode. É só parar e refletir um pouco sobre o plano que cada um tem para o país. Ele existe?    

terça-feira, 21 de maio de 2013

O mundo é muito maior que nosso umbigo, mas não adianta. Bolsa Família é "Bolsa Esmola", "Bolsa Vagabundo"


 Não queria escrever este texto. Em redes sociais, relutei e queria observar de canto a discussão que veio a tona sobre o Bolsa Família. Neste último final de semana, um boato sobre o fim do programa assistencial levou milhares de pessoas a agências da Caixa e Lotéricas para sacar o benefício.

Foi o estopim para o assunto explodir na internet de maneira depreciativa. No Facebook, a tentativa de desviar o olhar de comentários como “Bolsa esmola”, “Bolsa Vagabundo”, me embrulhava o estômago. Assim, comecei o exercício para (des) assinar o ‘feed’ de notícias de algumas pessoas - depois que caí na armadilha de entrar em um debate. Não dá. Nenhum argumento é plausível na ‘defesa’ de um ‘vadio’ que ‘mama nas tetas’ do governo. Caso o faça, não demora cinco minutos para ser chamado de petista. É semelhante à mãe com vários filhos que só beneficia o mais ‘carente’. Isso com o ‘agravante’ de que o outro filho paga pelo necessitado. A revolta impera. Feche os olhos e corra com o mouse para fugir das asneiras.   

Mesmo assim, em um atentado contra a gastrite, e consciente do que iria encontrar, resolvi acompanhar o que se falava nas páginas de grandes jornais no facebook.  Por lá, os comentários dos internautas aprofundavam a discussão para um poço de indignação e raiva. O discurso era claro: “O povo se aproveita deste donativo do governo, fica acomodado e ‘permanece’ na vagabundagem”, escreveu um rapaz apoiado por muitos. E o tema que auxilia quase 14 milhões de pessoas começou a ser ‘esmiuçado’: “as mulheres abrem as pernas só para receber mais bolsa.”, refletiu uma universitária. “E o filho ainda pode virar um ladrão ou assassino”, alertou um senhor que não tive coragem de acessar o perfil. É a máxima neoliberal do peixe, com requintes de preconceito. Se você o quer, vá pescá-lo, vadio. Qualquer pessoa pode ter um futuro bom se trabalhar, correr atrás do pão de cada dia. Só basta querer. Certo?

Alguns mais velhos justificam que começaram do nada, com ‘uma mão em um bolso e outra atrás’, como diz o velho ditado. E através do trabalho conquistaram bens e uma vida próspera. Um argumento como esse, com centenas de ‘likes’, foi aplaudido em pé na rede social. Ovacionado. No entanto, é bom lembrar que as regras do jogo capitalista não são as mesmas que 50 anos atrás. O jornalismo, por exemplo, tem inúmeros casos de quem começou de baixo e cresceu, tornando-se excelente profissional. Hoje, esse é o jornalismo considerado romântico, que não existe mais. Quer ser jornalista? Tenha um diploma. Todas as empresas vão pedir, mesmo sendo artigo desnecessário, segundo o STF. Na indústria, a tecnologia era inferior e não necessitava de tanta qualificação como hoje.  Outros citam poucos casos de pessoas que emergiram na sociedade hoje em dia por conta de seu trabalho e determinação. “Esses” correm atrás de seus objetivos. O 'resto' depende do governo e tem seu voto "comprado" por esses trocados que são pagos pela classe média. São 'pobres coitados', massa de manobra que é enganada pelo governo - que só busca votos. Entretanto, pode-se falar o que quiser sobre políticas populistas porque qualquer uma que seja implantada para favorecer os mais necessitados será taxada de 'compra de votos'. "Esse 'PT' é muito esperto, né", diz um jovem que não tinha idade suficiente para recordar que o primeiro programa assistencialista em âmbito nacional ocorreu no governo Fernando Henrique Cardoso (PSDB). Batizado de 'Bolsa Escola', o programa ajudou 4 milhões de pessoas.   

Agora, ao receber como herança um barraco insalubre com um punhado de farinha, passando fome, quero ver esse discurso ser entoado. “Blogueiro hipócrita”, alguém certamente deve bradar. “Você não sabe o que é isso e vem falar a respeito”. Ou chamar este “hipócrita” de “chato” e “burro” por “pagar a conta” destes ociosos. Passado o momento de ‘desqualificação’ deste que vos escreve, quem pode dizer onde existe trabalho para um rapaz analfabeto - que não teve acesso à escola, por conta do trabalho para sobreviver – na região metropolitana de São Paulo? Com trabalhos esporádicos, quando consegue, recebe entre R$ 70 e R$ 150. É possível viver desta maneira? É possível comprar remédios anticoncepcionais ou camisinhas? Como seria para você viver um mês desta maneira? Um ano? Bom, primeiro é necessário sair rapidinho da internet, afinal, a conta no fim do mês saí por volta de R$ 100. E como seria 'escapar' deste fosso que é a falta de qualificação profissional e educacional com renda diminuta, trabalhando, quando possível, 12 horas por dia? O Brasil tem 12,9 milhões de pessoas analfabetas, segundo relatório de 2012 da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad).

Porta de saída

De acordo com o Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, 1,69 milhão de famílias deixaram espontaneamente o programa, alegando que sua renda havia ultrapassado o limite de R$ 140 por pessoa. Estas famílias representam 12% em um universo de 14 milhões de beneficiários. Para aumentar a  desistência, é necessário instaurar um programa de qualificação profissional atrelado ao benefício. Esta é a melhor porta de saída para o Bolsa Família, e já existem diversos casos de cooperativas e associações que fazem a inserção das pessoas no mercado do trabalho.  

Críticos do programa

Após ler este texto, e de me criticar um bocado, aposto que nenhum parágrafo teve a concordância dos  ferrenhos defensores do trabalho. Mas será que não entra na cabeça deles que o beneficiário necessita deste dinheiro para complementar sua renda, para lutar com o mínimo necessário para sobreviver, em busca da saída desta condição de extrema miséria, enraizada no país há séculos? Acho que não.  E começo cada vez mais a entender a reflexão profunda que a professora Marilena Chauí lançou outro dia. A filósofa fez duras críticas à classe média. “A classe média é uma abominação política, porque é fascista, é uma abominação ética porque é violenta, e é uma abominação cognitiva porque é ignorante. Fim”, concluiu. Ao observar algumas discussões a respeito de temas polêmicos como o Bolsa Família, o pensamento de Marilena Chauí faz muito sentido.