terça-feira, 10 de setembro de 2013

Travessias

Rio Pinheiros - 1929 (Marginais
foram inauguradas em
1970). 
2013. 
Estressado, o homem não aguentava mais o som das buzinas que o atordoava a cada cinco minutos como se fosse uma orquestra filarmônica desafinada. Sozinho dentro de uma super-máquina possante que soltava fumaça preta a cada aceleração, sua preocupação era grande com o trânsito que o impedia de avançar ao outro lado da Marginal, em São Paulo. “Maldita via”, reclamou - para logo em seguida constatar que não tinha outra opção para atravessar o rio Pinheiros - na altura do Clube Hebraica. Com o relógio apertando seu prazo e ameaçando sua carreira profissional nada era mais importante que chegar naquela reunião. Parado, mas com a cabeça a mil por hora, iniciou percurso pelas estações de rádio em busca de notícias daquela morosidade no fim da tarde. Não encontrou. Sacou seu telefone recheado de aplicativos que lhe dizem até a cor da cueca a ser usada no dia. Entretanto, não obteve nenhuma informação que diminuísse sua angústia. Em mais dez minutos, andou poucos metros e trocou de faixa. Atrás de um caminhão que despejava monóxido de carbono diretamente em seu veículo, protestou novamente com gritos, fechou a janela e ligou o ar condicionado. A ansiedade e o nervosismo tomaram conta de si. Resolveu buzinar por um minuto como se urrasse por locomoção. Desistiu. A reunião estava perdida. O barulho assustou uma capivara, que em um canto do leito do rio se escondeu. O homem nem percebeu.

1513.
Estressado, o homem não aguentava mais andar perdido na mata densa. O som dos passarinhos, como se fosse uma orquestra sinfônica, tornava tudo similar: som e imagem, o que fazia a beleza confundir tudo. Descalço com os dois pés fincados no mato, sua preocupação era encontrar os companheiros perdidos durante a caçada do dia para logo depois atravessar o rio. Tarefa dura diante de uma região quase intocada, repleta de Pinheiros, com poucas trilhas abertas para a circulação.  Respirou. Inspirou. Olhou para uma Paineira enorme, a abraçou e pediu ajuda. Sentado em uma grande raiz, cercado de verde por todos os lados, resolveu seguir paralelo a um feixe de luz quando encontrou o rastro de seus colegas. De volta a trilha, seguiu por onde havia caminhado até encontrar a parte alagadiça do terreno. O rio estava próximo. Ao reencontrar os amigos, realizou a travessia da água com sua canoa. Do outro lado, um grupo de capivaras se alimentava de árvores próximas de seu aconchego. O homem, ao avistar este cenário, pensou com alegria: “Estamos voltando pra casa”.

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